Gostei muito desse artigo do Rubens Ewald Filho
A Grande Beleza (La Grande Belleza) Italia, 13. Direção de Paulo
Sorrentino. Com Toni Servillo, Carlo Verdone, Serena Grandi, Fanny
Ardant, Sabrina Ferilli, Carlo Buccirosso, Iaia Forte, Giorgi Passotti,
Isabella Ferrari.
Favorito para o Oscar de filme estrangeiro deste ano, vencedor de
melhor filme europeu, indicado para o Globo de Ouro, Independent Spirit,
este é o sexto e melhor filme de um cineasta napolitano Paolo
Sorrentino que até agora não é muito conhecido por aqui. Alguns podem
lembrar de algum Festival com o “Il Divo”, o drama sobre um astro do
rock, Sean Penn ( o interessante “Aqui é o meu Lugar”) e em breve terá
feito episódio para “Rio, Eu Te Amo”. Mas só agora que conquistou seu
espaço como o herdeiro de Fellini, com este filme espetacularmente belo,
que é melhor descrito como uma versão 60 anos depois de “La Dolce
Vita”, agora a cores e com o personagem do jornalista (feito então por
Mastroianni, aqui pelo grande ator teatral Toni Servillo, que nessa
altura escreveu apenas um romance de sucesso e desperdiçou seu tempo em
coisa alguma, continuando a ser o jornalista favorito dos ricos e
famosos, dando festas na cobertura-terraço de seu apartamento perto do
Coliseu).
Fellini é assumidamente a chave fundamental para penetrar no
filme, o que não deixa de ser um problema já que são dez anos de sua
morte e muita gente já não tem a menor idéia de quem ele seja. Ainda
mais para identificar que é utilizado seu estilo narrativo, seus
habituais movimentos de câmera, marcações, figurantes bizarros, trilha
musical misturando como a própria cidade de Roma o sagrado e o profano(
alias as danças nas festas são um charme a parte). Na verdade, ajuda
muito a embarcar no filme ter essa chave. E mergulhar num retrato
contemporâneo e altamente critico –porém sutil- de uma sociedade
talentosa, uma cidade linda, uma população cheia de energia mas que se
perde em banalidades. Algumas das citações porém é possível que a gente
perca por falta de maior conhecimento do cotidiano romano (uma das
poucas que eu descobri foi a presença de Serena Grandi, que foi uma
voluptuosa estrela da teve que agora ficou uma bruxa impressionante. É
ela que leva a bronca justamente quando vai tomar injeção de Botox!).
Talvez por causa disso, o espectador casual pode se perder diante
do filme ate porque faz tempo que não se cultua mais a beleza como um
fator de qualidade no cinema.A Fotografia em filmes de arte europeus e
até orientais recentes tem sido granuladas e feias.Mesmo no italiano que
já teve a melhor direção de arte, a melhor fotografia, melhores
figurinos, do mundo, que dava aulas para Hollywood em Cinecittá. Este
filme dá sinais de que nem tudo esta perdido. Aqui, Roma volta a ficar
deslumbrante, fotografada de maneira requintada e original. Como afirma
Sorrentino: “Queria que as luzes de movessem com o filme. Gostava muito
dessa idéia. Então ou as luzes se movem ou os personagens entram ou saem
da luz o tempo todo”.
Há naturalmente outro fator subjacente e evidente: o filme retrata a
época desonrosa em que a Itália era dirigida pelo primeiro ministro
Berlusconi e sua cultura do Nada, um palhaço que mais parecia um
imperador daquela linha Calígula, guardadas as diferenças. Que era
corrupto, superficial, adorava orgias e que finalmente acabou sendo
cassado (e para piorar dominava todos os meios de comunicação). Nessa
Roma do filme é a historia de alguém (no caso o diretor, não o
personagem) que tenta encontrar algum sentido num mundo onde justamente
as coisas perderam o sentido! Onde se acentuou a vulgaridade, a perde do
sentido do pudor, vergonha, modéstia, discrição!
Não é apenas uma carta de amor à cidade eterna mas uma denuncia
dos excessos da Itália atual, que propicia aos romanos uma vida muito
dura, sem sentido, cansativa e difícil. Mas para quem estiver atento
não faltam momentos de incrível beleza e simbologia (um exemplo: a
menina que reclama dos pais que a forçam a trabalhar. Mas chorando vai
cumprir o dever e pintar um quadro com tinta que joga numa tela branca. E
que surpreendentemente resulta muito bonita e complementar !).
O diretor dá algumas chaves para isso. Há uma citação no começo de
um autor preferido de Sorrentino, Louis –Ferdinand Céline Viagem ao Fim
da Noite. Que podia se resumir assim “Nossa viagem é inteiramente
imaginaria. Esta é sua força”.Depois se formam círculos como no inferno
de Dante. E por fim refere-se ao Livro que Flaubert queria escrever e
seria sobre o Nada.
A Grande Beleza é a tentativa de louvar o belo enquanto se critica
justamente a essa cultura do nada, do burro, do vulgar. Como já disse é
preciso não esperar uma narrativa tradicional e se deixar levar pelo
redemoinho de imagens (que disparam após um tiro de canhão), com algumas
ocasionais citações explicitas de La Dolce Vita (a visita ao palácio
com velas, a sequencia com a velha freira que seria milagrosa, a visita
ao cabaret de mulheres nuas, a aparição crepuscular de Fanny Ardant
(como fazia Anna Magnani em Roma de Fellini alias a presença freqüente
de freiras de todos tamanhos e idades, também fazem pensar no desfile de
trajes eclesiásticos). E muita impressionante como imaginação e
realização que nos tempos atuais talvez só um Wong Kar Wai seria capaz
de concorrer (ainda em outra esfera).
Acho A Grande Beleza um filme fascinante e o retorno da Beleza as
imagens do cinema italiano. Que seja bem vindo. Temos agora um Novo
cineasta genial para conferir.
REF
Link para o original: http://rubensewaldfilho.blogspot.com.br/2013/12/a-grande-beleza.html
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