sábado, 25 de agosto de 2012

Coletânea mostra pesadelos e obsessões de Philip K. Dick

"Realidades Adaptadas" traz histórias que foram transpostas para o cinema

BRAULIO TAVARES
ESPECIAL PARA A FOLHA


O editor David Hartwell disse uma vez que qualquer livro de Philip K. Dick pode servir de porta de entrada para sua obra, porque Dick está inteiro em cada um dos seus livros, com a sua maneira única de escrever e a sua visão peculiar da realidade. Dick (1928-1982) foi um escritor obcecado por meia dúzia de temas filosóficos, políticos, científicos.

Se começasse a escrever qualquer história, fosse uma história sobre colônias espaciais, sobre donas de casa regando o jardim ou sobre soldados em guerra, cedo ou tarde estaria falando sobre líderes messiânicos, perda de identidade, a distinção entre homem e máquina.

Isso também se observa nos seus contos curtos, que decolam das situações iniciais mais improváveis mas acabam sempre sobrevoando o mesmo território.

A editora Aleph reuniu em um volume as histórias curtas de Dick que foram adaptadas para o cinema.
Ficam de fora os romances adaptados, como, por exemplo, "Do Androids Dream of Electric Sheep?" (1968), que resultou em "Blade Runner" (1982), e "A Scanner Darkly" (1977), adaptado como "O Homem Duplo" (2006).

Um dos temas preferidos do autor era o da possibilidade de calcular as probabilidades de ocorrência de diferentes variantes do futuro. Seus precogs, mutantes com essa capacidade, aparecem aqui em "O Relatório Minoritário" e "Segunda Variedade".

São precursores dos romances de William Gibson e seus heróis capazes de observar uma quantidade espantosa de dados e indicar tendências, sem saber, no entanto como o fazem.

LABIRINTO

Em "O Pagamento", Dick antecipa os videogames onde o jogador reúne objetos cuja função só será descoberta nos momentos de perigo.

Elementos da Guerra Fria estão presentes em "Equipe de Ajuste" (uma metáfora das manipulações dos governos) e "Segunda Variedade" (em que russos e androides são equiparados).
Stanislaw Lem, o autor de "Solaris", disse que, ao contrário de outros autores, Dick não se comporta como um guia que conduz o leitor dentro do romance; ele parece estar igualmente perdido no labirinto. Suas histórias têm um começo espantoso e um final desconcertante.

É como se o ato de escrevê-las fosse abrindo janelas em sua mente e revelando outras cenas, outras situações.

Cada história sua é o pesadelo de um sujeito que se vê diante de coisas impossíveis e precisa inventar uma explicação do Universo que inclua ele próprio e aquele fato.

BRAULIO TAVARES é escritor e compositor. Publica no blog Mundo Fantasmo (mundofantasmo.blogspot.com)

REALIDADES ADAPTADAS
AUTOR Philip K. Dick
EDITORA Aleph
TRADUÇÃO Ludimila Hashimoto
QUANTO R$ 48 (304 págs.)
AVALIAÇÃO bom




FOLHA DE S.PAULO
25/08/2012

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