domingo, 3 de julho de 2011

Seis meses de Dilma :: Suely Caldas

A presidente Dilma Rousseff completou seis meses de gestão sem apresentar ao País um programa de governo e sem definir diretrizes que ajudem a orientar ações e decisões de agentes públicos e privados rumo ao progresso. Ela pode argumentar que seu governo é de continuidade, portanto as diretrizes já são conhecidas. Não é bem assim. Também Lula não tinha programa e, depois que desistiu das reformas, passou a agir sobre o presente, ignorou o futuro.

Além disso, nesses meses os brasileiros conheceram uma presidente muito diferente de seu antecessor. Em estilo e, também, em conteúdo. A decisão de privatizar aeroportos e 45 portos, a carta carinhosa a FHC pelo aniversário de 80 anos, o reconhecimento de seu governo ao legado do ex-ministro tucano Paulo Renato na educação e sua aversão ao ódio, ao preconceito e ao deboche contra a oposição - que Lula tanto cultivava - são atitudes que os brasileiros percebem em Dilma como positivas, esperança de um ambiente político mais construtivo e que dizem mais que uma simples diferença de personalidades.

Nesses seis meses Dilma mudou radicalmente a relação com o Congresso. Sua atitude dura de não ceder ao condenável troca-troca de Lula lhe rendeu vitórias e derrotas. A vitória na votação do salário mínimo, em fevereiro, a animou a resistir à ocupação de cargos por espertos despreparados. E a perda do ministro escalado para tratar com os partidos a levou a assumir o comando da gestão com a base aliada - papel que lhe causa desconforto e insegurança; não gosta. A derrota na votação do Código Florestal mostrou que seu embate com o clientelismo, o fisiologismo, o oportunismo e tudo o mais que brota dos partidos aliados será mais difícil e longo do que ela imaginou. Na quinta-feira ela cedeu e prorrogou por mais três meses o prazo para pagar as emendas aos parlamentares. Mas já avisou que só vai liberar metade dos R$ 4,6 bilhões programados.

No Brasil, a relação entre Executivo e Legislativo é errada, porque mira interesses mesquinhos dos partidos e ignora os do País, e viciada, porque se baseia na chantagem política rasteira. Perdem-se semanas, meses negociando cargos e verbas para aprovar uma única matéria, no fim comemorada com triunfo - o que deveria ser ágil e corriqueiro na vida do Legislativo. Dilma parece querer mudar isso para poder governar. A ver.

Na esfera econômica, a presidente vai transferir ao setor privado a construção e gestão de 3 aeroportos e de 45 portos marítimos, ignorando o estúpido preconceito político alimentado pelo PT e por Lula em campanhas eleitorais. Pragmática, Dilma não emperra o progresso: se o Estado não tem dinheiro nem competência para construir portos, que o faça o setor privado. O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, finalmente concluiu negociação com empresas privadas de telefonia para oferecer banda larga a preços populares, encerrando o que a gestão Lula arrastou por mais de um ano e não resolveu. Na área social ela lançou o Plano Brasil sem Miséria, com metas definidas para acabar com a extrema pobreza. A ver.

Após seis meses é o que se conhece das intenções do governo. O País precisa de muito mais: de um rumo que defina programas, prioridades e metas na educação e na saúde. E, na área econômica, definir com o setor privado regras para investimentos em infraestrutura e eliminar gargalos que impedem o País de crescer sem o fantasma da inflação.

Escola. O caso Pão de Açúcar-Casino-Carrefour-BNDES tem tudo para fazer escola e atrair seguidores. A receita é simples: se a empresa passa por dificuldade financeira, o empresário brasileiro vende parte de seu empreendimento a um investidor estrangeiro e com ele assina um acordo de acionistas concordando em transferir-lhe o controle acionário no futuro, com prazo definido. Ao se aproximar esse prazo, o empresário corre ao BNDES e alerta para a iminência da desnacionalização da empresa. Como o banco tem horror à desnacionalização, despeja dinheiro público para evitar a tragédia. Falta dinheiro na saúde? Falta. Varejo é setor estratégico? Não. Ainda assim, o BNDES faz a operação.

Jornalista e professora da PUC-Rio

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