sábado, 9 de julho de 2011

RUY CASTRO - Inocentes e cúmplices

RIO DE JANEIRO - Ninguém definiu Brasília com mais precisão que o nunca por demais citado Nelson Rodrigues. No começo dos anos 70, ele escreveu numa crônica: "Em Brasília, todos são inocentes e todos são cúmplices". Notar que a nova capital tinha então meros dez anos, dos quais seis ou sete sob a ditadura -época pouco propícia a denúncias e revelações. Mas já era difícil camuflar tudo que exalava de seus gabinetes.

Quem vá a Brasília e passe algumas horas nas imediações do Congresso ou dos ministérios, e converse com qualquer profissional afeito à área -motoristas de táxi, por exemplo, muitos dos quais trabalharam para um graúdo no passado-, sai com as orelhas fervendo sobre todo tipo de mutreta já praticada ou em curso. Esse tipo de popular bem informado é inevitável em cidades onde política e negócios são quase sinônimos.

Se, por falta de outro assunto, até a periferia do poder sabe tudo de todo mundo, imagine o seu centro. Não importa que de diferentes partidos, os 513 deputados federais e os 81 senadores são íntimos entre si de há muitos Carnavais. E, se alguns estiverem no seu primeiro Carnaval, não faltam assessores que também se conhecem e podem levantar -literalmente- suas fichas em poucos minutos. Já os ministérios e as secretarias têm quadros fixos -gente cascuda e bem informada, da área técnica, para quem nenhuma manobra passa em branco.

Segue-se que, antes de alguém se tornar ministro ou exercer cargo importante em qualquer área do Executivo, nada em seu comportamento, currículo ou folha corrida será segredo para quem o nomeia. Não há segredos em Brasília. Só silêncios. E, mesmo assim, só por algum tempo, até que se torne conveniente ou inevitável rompê-los.

Se todos sabem tudo, isso explica que não passem o dia se acusando mutuamente. Todos são inocentes e todos são cúmplices.

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