segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Apenas 12% dos brasileiros sabem nome de cientista

Apesar do aumento de interesse declarado por ciência, poucos conhecem pesquisador ou instituição científica. Enquete do governo que consultou 2.016 pessoas também mostra que a maioria não frequenta museus de ciências

Não é só por bola de futebol que o brasileiro se interessa, mas também por pipetas e microscópios. Pelo menos é isso o que sinaliza uma pesquisa do MCT (Ministério de Ciência e Tecnologia). De acordo com os dados, o brasileiro está mais interessado em ciência e tecnologia do que estava em 2006 e o interesse declarado (ou seja, o que a pessoa afirma ter) já supera até o tema "esportes".

No entanto, apenas 12% dos entrevistados conseguem citar o nome de um cientista brasileiro e só 18% sabem mencionar de cabeça uma instituição científica.

Quem consegue nomear está na parte mais rica da população. "Isso mostra que o Brasil ainda é uma país extremamente desigual", analisa o físico Ildeu de Castro Moreira, coordenador do trabalho.

E os cientistas mais citados são Oswaldo Cruz e Carlos Chagas. "Praticamente ninguém menciona cientistas sociais, sendo que o Brasil têm nomes importantíssimos como Paulo Freire e Gilberto Freyre", completa.

A pesquisa consultou 2.016 brasileiros com objetivo de investigar as atitudes e percepções dos brasileiros sobre a ciência e tecnologia. O trabalho dá continuidade a uma investigação similar realizada em 2006.

Resultados

A amostra foi desenhada de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de modo que os resultados possam ser projetados para o que o brasileiro "médio" pensa sobre vários temas.

O nível de interesse em ciência e tecnologia aumentou significativamente desde 2006. O número de interessados ou muito interessados no tema subiu de 41% para 65% dos respondentes.

Em meio ambiente, o interesse disparou de 58% para 83% no mesmo período - empatando com o gosto por medicina e saúde. Para o coordenador do trabalho, o resultado condiz com o momento atual de preocupações ambientais no mundo e no Brasil - especialmente na Amazônia.

Futebol e ciência

Outro dado que chama atenção é que o tema "ciência" tem quase o mesmo nível de interesse declarado (65%) que esportes (62%). "As pessoas, no geral, estão mais interessadas em todos os assuntos. No caso da ciência, isso reflete o momento positivo da situação econômica do país e a ampliação do acesso a espaços e atividades científico-culturais", explica Moreira.

Apesar do interesse científico declarado de boa parte dos entrevistados, 92% dos consultados revelaram que não frequentam museus de ciência (37% dos quais sob a justificativa de que eles não existem na sua região).

Mesmo baixo, o número de visitantes dobrou desde 2006, passando de 4% para pouco mais de 8%. Entre as pessoas com ensino superior completo, no entanto, o índice de visitação sobe para 14% dos respondentes - e se aproxima dos índices europeus, que é 18%.

Mais confiança

Outro dado que muda de acordo com a escolaridade e classe econômica do entrevistado é o índice de confiança em determinados profissionais como fonte de informação - com exceção de médicos, que são "confiáveis" para todas as classes.

Entre os mais pobres, a confiança nos religiosos é maior do que nos cientistas. Já nas classes com mais recursos e formação, os campeões são os cientistas de instituições públicas. Quem faz ciência em instituições privadas parece ter uma certa descrença do entrevistado.

Em relação à ciência brasileira, a opinião geral é que ela vai bem. A avaliação sobre a posição da ciência do Brasil no mundo tem se tornado cada vez mais positiva. Para metade dos brasileiros consultados, ela está hoje em uma posição intermediária.

Mas, novamente, o resultado muda conforme a condição econômica: pessoas de classes menos favorecidas têm, em geral, uma posição mais otimista em relação à ciência brasileira. Em outras palavras, quanto menor o nível econômico do entrevistado, mais ele declara achar que a ciência nacional é bastante avançada.

Pesquisas de opinião podem direcionar políticas

As pesquisas de percepção pública da ciência e da tecnologia já acontecem com certa periodicidade há algumas décadas em países da Europa e também nos EUA.

Inicialmente, a ideia desses trabalhos era entender a quantas andava a imagem da ciência e dos cientistas depois de grandes estragos causados, por exemplo, com a Segunda Guerra Mundial.

Mais tarde, os dados coletados regularmente por esses trabalhos acabaram servindo como um termômetro do interesse e conhecimento da sociedade sobre ciência, tecnologia e outros temas.

Sabendo o que as pessoas pensam e querem, os governos poderiam formular políticas públicas nessas áreas - por exemplo, criar museus.

Na América Latina, os trabalhos de percepção pública são mais recentes. O Brasil entrou nesse barco na década de 1980, quando fez um grande trabalho nacional comandado pelo CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento).

Mas a primeira grande enquete foi feita em todo o país com metodologias internacionais apenas em 2006. Em São Paulo, a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) também inseriu o tema "percepção pública da ciência" na sua última publicação de indicadores de ciência e tecnologia, de 2005.

Ideia abstrata

Para a socióloga da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) Maria Conceição da Costa é importante destacar que não está claro o que as pessoas entendem por "ciência" quando respondem essas pesquisas.

"Provavelmente, o conceito de "ciência" das pessoas esteja relacionado ao que elas encontram na mídia, especialmente na televisão", diz.

Já a pesquisadora Simone Figueiredo, também da Unicamp, acredita que o termo "ciência", para a maioria dos respondentes, ainda está relacionado aos temas vistos nas escolas desde cedo, como física, química e biologia.

Outro "problema" desse tipo de trabalho é que a pessoa consultada muitas vezes quer agradar o entrevistador e acaba respondendo algo que soe positivo - como, por exemplo, afirmar o gosto por ciência e tecnologia.

Na Europa e nos EUA, algumas dessas pesquisas incluem um pacote de questões que tentam mensurar a "alfabetização científica" dos entrevistados. É um conjunto de perguntas de conteúdo científico em que é preciso responder "certo" ou "errado" (por exemplo, se o homem já foi à Lua).

No entanto, especialistas acreditam que essas perguntas revelam mais uma posição cultural do respondente do que seu conhecimento real sobre um determinado assunto científico.

Independente da concepção individual que se tenha de "ciência", a pesquisa do MCT, de acordo com o coordenador do trabalho, serve como um termômetro sobre o assunto e pode direcionar políticas públicas na área.

"Já usamos dados da pesquisa de 2006 no ministério e o novo ministro [Aloizio Mercadante] já tem os dados novos, que podem integrar as políticas do "PAC" da ciência", diz Moreira, do MCT.

(Sabine Righetti)

(Folha de SP, 10/1)

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