Revista Língua
Edição 93 - Jul/2013
Foram 13 anos até que o Superior Tribunal de Justiça concedesse ganho de causa à rede Globo num processo por plágio.
A
escritora de livros infantis Eliane Ganem alegava que a minissérie
global Aquarela do Brasil, escrita por Lauro Cesar Muniz, usava um
argumento seu, que ela diz ter submetido a outras emissoras na época.
Muniz afirmou em sua defesa que o mote principal da série - o da
personagem que se torna famosa - era uma ideia banal, que carecia de
ineditismo.
Apesar da vitória da emissora, o caso ganha
ambiguidade pelo simples fato de Eliane ter registrado a obra na
Biblioteca Nacional em 1996 com o mesmo nome da minissérie, que foi ao
ar quatro anos depois. Em 2008, a Justiça já havia ordenado o pagamento
de uma indenização de R$ 100 mil à autora. Mas agora, com a decisão da
4ª Turma do STJ, a ação foi definitivamente encerrada.
RedeO
que disputas como essa parecem evidenciar, para além das reviravoltas
jurídicas, é a delicada questão da autoria. O que caracteriza uma ideia
original? Numa seara como a da propriedade intelectual, em que a
materialidade das provas às vezes é tão palpável quanto fumaça, a velha
pergunta sobre o que é novo volta revigorada a cada escândalo de plágio.
A complexidade dos casos acaba colocando em xeque o próprio conceito de
originalidade.
A internet facilitou o manuseio da informação.
Seus mecanismos automatizaram nossa relação com o texto. Sinal disso é a
popularidade da expressão "Ctrl-c, Ctrl-v", comando equivalente a
"copiar e colar" em navegadores e processadores de texto, emblema de uma
geração que pouco digere do material que encontra na internet,
reproduzindo-o como se fosse seu.
Outro sintoma alarmante da
banalização do plágio também se encontra no ambiente universitário e
acadêmico, cuja credibilidade vem sendo solapada por denúncias de
apropriações não creditadas de teses e artigos acadêmicos [ver quadro da
página ao lado].
EspíritoNo jornalismo, o
plágio também já fez suas vítimas: nos EUA, o jornalista e escritor
Fareed Zakaria foi suspenso pela revista Time por se apropriar de
trechos de um artigo da New Yorker em 2012.
Nem a literatura
escapou desse fantasma no episódio, agora célebre, que envolveu Max e os
Felinos (1981), de Moacyr Scliar, e A Vida de Pi (2001), de Yan Martel.
- Até onde possa me lembrar, nunca fui vítima de plágio. Até
porque em literatura isso é muito complexo. Os temas são eternos e nós
todos circulamos entre eles. Aqueles que procuram escrever a todo custo
terminam copiando e, é claro, errando. Muitos escritores fracassam
porque querem o sucesso e não o êxito. E, em literatura, só o êxito
interessa - afirma o escritor Raimundo Carrero, autor de Tangolomango
(Record).
O sucesso, no entanto, parece ter vindo acompanhado
também pelo êxito no caso do escritor canadense Yan Martel. Vencedor do
Booker Prize 2002 com o romance A Vida de Pi, adaptado em 2012 para os
cinemas por Ang Lee, Martel não só assume ter se inspirado na premissa
de Max e os Felinos como se gabou de ter aproveitado melhor a história
do menino preso num barco com um tigre.
As semelhanças entre as
obras foram notadas pela primeira vez pelo jornal inglês The Guardian, à
época do lançamento do livro de Martel, que, pressionado pela imprensa,
contra-atacou: "Será que haveria o mesmo escândalo se eu dissesse que
me inspirei na arca de Noé?".
Mais tarde, Martel e Scliar
entrariam em acordo amigável, intermediado por Luiz Schwarcz, editor da
Companhia das Letras, que passaria a editar o escritor gaúcho.
O
que parece estar em jogo na provocação do escritor canadense, no
entanto, é o fato de que certas ideias não são exclusivas de uma cabeça,
mas pertencem a uma narrativa maior, de domínio coletivo, podendo ser
retrabalhadas por vários autores em tempos diferentes e de formas
diversas. O que não exclui o fato de que as similaridades entre as obras
de Martel e Scliar são muito mais concretas e específicas do que a
metáfora genérica da arca de Noé.
No caso da minissérie global
Aquarela do Brasil, o resultado da perícia atestou que tanto a ideia de
Lauro Cesar Muniz quanto a de Eliane Ganem eram inéditas, sem
semelhanças suficientes que configurassem plágio. É como se as duas
ideias, na verdade uma só, tivessem nascido pelas mãos de autores
diferentes separados no tempo e no espaço, resultado de algum espírito
de época [Zeitgeist, em alemão] ou sob inspiração de algum elemento
cultural recorrente.
Em outras palavras, a trajetória de uma
cantora que sai da pobreza para o estrelato, posto dessa maneira, não
chega a ser novidade, ainda que a "coincidência" entre os nomes das
tramas de Muniz e Eliane nos deixe com a pulga atrás da orelha.
"Não
é possível deter direitos sobre temas", afirmou o ministro e relator do
processo Luis Felipe Salomão, que por sua vez citou em sua decisão o
doutrinador Hermano Duval, para quem ideia e forma de expressão são
coisas independentes.
Em Direitos Autorais nas Invenções
Modernas (1956), obra de referência nos estudos sobre propriedade
intelectual, Duval afirma que uma ideia "não pertence exclusivamente aos
autores das obras em conflito, pertence a um patrimônio comum da
humanidade".
Se no conteúdo as evidências de plágio tendem a ser
vagas, passíveis de reformulações e subterfúgios de estilo, na
expressão a forma com frequência denuncia o decalque.
Com estiloO
escritor francês Michel Houellebecq que o diga. Em 2010, foi acusado de
plágio pelo site Slate, que descobriu trechos inteiros de verbetes da
Wikipédia francesa reproduzidos no romance O Mapa e o Território
(Record).
Houellebecq, obviamente, negou as acusações, as quais
considerou "rídiculas". Mas sua inocência deve-se antes ao gesto
deliberado de reproduzir os trechos do que ao crime de falsa autoria.
"Se as pessoas de fato pensam isso, então elas não têm a menor noção do
que é literatura. Isso faz parte do meu método", rebateu.
A
premissa de Houellebecq, fundamentada no uso estilístico do plágio,
mostra-se afinada com as vanguardas literárias mais recentes, cujos
experimentos com a matéria verbal partem de princípios como
reorganização, reciclagem, reapropriação e até mesmo plágio deliberado.
Não
por acaso, o escritor Kenneth Goldsmith, editor do site UbuWeb -
dedicado à literatura conceitual - pegou emprestado o termo "unoriginal"
[algo como "desoriginal"] da crítica literária Marjorie Perloff para
tecer seu artigo-manifesto It''s Not Plagiarism. In the Digital Age,
It''s "Repurposing." [Não é plágio. Na era digital, é "repropósito"].
Para
Goldsmith, numa época abarrotada de textos como a atual, não haveria
necessidade de escrever mais. Em vez disso, ele defende a necessidade de
"aprender a negociar a vasta quantidade que já existe". "Como eu abro
caminho em meio a esse matagal de informação - como eu o gerencio,
analiso, organizo e distribuo - é o que distingue a minha escrita da
sua."
- É uma literatura em que o autor quase não escreve, e
cujos métodos se assemelham à colagem dos pintores cubistas e à
apropriação de objetos industriais feita por artistas como Marcel
Duchamp ou Andy Warhol - explica o escritor Braulio Tavares, colunista
de Língua, referindo-se ao método preconizado por Goldsmith.
Mas
aquilo que as vanguardas pós-modernas passaram a tratar como colagem,
reapropriação ou seja lá que nome leve, no início do século 20 já se
encontrava formulado pelos primeiros modernistas, premidos pela
perspectiva de que nada mais pudesse ser feito, já que tudo havia sido
dito pelas gerações anteriores.
A questão da originalidade, por
exemplo, foi tema central na obra de escritores como T. S. Eliot, autor
de Terra Devastada, que comparou os poetas aos ladrões no ensaio "Philip
Massinger", em Sacred Wood [floresta sagrada]:
"Poetas imaturos
imitam; poetas maduros roubam; maus poetas deformam aquilo que tomam, e
bons poetas fazem daquilo algo melhor, ou ao menos algo diferente".
ReapropriaçãoSeguindo a metáfora eliotiana, o escritor e tradutor Gabriel Perissé, de Língua, acrescenta:
-
Devemos ser tão bons ladrões que ninguém perceba que fizemos com o
alheio algo melhor. O plágio criativo perfeito é quando o roubo é
seguido de assassinato, e nem precisamos citar a vítima, cuja alma
absorvemos e cujo corpo escondemos dentro do nosso próprio texto.
Uma
frase em particular, já atribuída a tantos autores no século passado a
ponto de ser considerada apócrifa, dá bem a medida da relativização do
conceito de originalidade em nossa época, além de ser ela própria uma
"licença poética" para o plágio criativo:
"Se você rouba de um autor, é plágio; se você rouba de vários, é pesquisa".
Segundo
o site Quote investigator, o primeiro registro desse enunciado é de
1932, seguido de variações que às vezes levavam em conta "livros" em vez
de "autor", "novidade" em vez de "pesquisa", entre outras
equivalências. Sua mensagem, porém, permaneceu intacta. Em outras
palavras, reside na multiplicidade de vozes a base de uma linguagem
original. E quanto menor o número de fontes de inspiração e de pesquisa,
maior a chance de soar parecido com algo que já foi produzido.
CriptomnésiaUm dos casos mais conhecidos de "roubo" na literatura talvez seja o romance Lolita, de Vladimir Nabokov, publicado em 1955.
Diferentemente
do que se imagina, a história do homem culto, que recorda seu caso
tórrido com uma pré-adolescente, na verdade foi publicada pela primeira
vez sob a forma de um conto pelo alemão Heinz von Lichberg, em 1916.
O
escritor e ensaísta Jonathan Lethem relata a estranha coincidência
entre essas duas narrativas no artigo "O êxtase da influência",
publicado em 2007 pela Harper''s. No texto, Lethem se detém sobre a
possibilidade de Nabokov ter se apoderado da trama conscientemente
enquanto esteve em Berlim, em 1937.
Outra hipótese levantada
pelo ensaísta é a de que um dos romances mais populares do século 20
tenha sido fruto de um fenômeno conhecido como criptomnésia, espécie de
plágio "não deliberado" que ocorre quando uma memória ressurge sem que o
sujeito se dê conta de sua origem, tratando-a como se fosse original.
-
A criptomnésia é uma memória escondida, que não se sabe ter. O fenômeno
pode ser cogitado quando o artista nega ter feito o plágio de forma
intencional ou não se lembra de ter "copiado" algo - explica Daniel
Martins de Barros, psiquiatra do Instituto de Psiquiatria do Hospital
das Clínicas de São Paulo e coordenador médico do Núcleo de Psiquiatria
Forense e Psicologia Jurídica.
Para Barros, a tese da
criptomnésia, na prática, é muito difícil de ser provada, mas por ser
uma tese acatada pela Justiça, pode servir como atenuante.
- Embora não se trate de uma doença, não há deliberação racional ou produção intencional - pondera.
Ainda
que a modernidade tenha colocado na berlinda a questão da autoria - e
os pós modernos a esgarçaram a ponto de quase aniquilar o conceito - há
quem discorde dessa pulverização do autor.
Para o crítico e
escritor Antonio Cicero está claro que "a morte do autor", postulada
pelo teórico Roland Barthes em ensaio homônimo [ver quadro na próxima
página], deve ser entendida em termos da autonomia do texto em relação
ao seu produtor, e não propriamente como a insignificância deste. Em
ensaio publicado na Folha de S.Paulo em 2010, Cicero questiona o
conceito que influenciou gerações de estruturalistas e de estudos
literários:
"Ao contrário do que Barthes pretende, não é verdade
que o autor seja ''uma figura moderna'', um produto de nossa sociedade
na medida em que, ao emergir da Idade Média com o empirismo inglês, o
racionalismo francês e a fé pessoal da Reforma, ela descobriu o
prestígio do indivíduo ou, como se diz de modo mais elevado, da ''pessoa
humana''".
Cicero acrescenta que "A figura do autor é
indissociável do próprio emprego da escritura e já se encontra
inteiramente definida na Antiguidade clássica."
Se a segunda
metade do século 20 assistiu ao declínio do autor nos círculos teóricos e
acadêmicos, talvez estejamos presenciando um renascimento, neste início
de século 21, do conceito de autor como uma espécie de "curador" de
conteúdos e formas.
Não que seu papel tenha se restringido à
mera reprodução do que já foi dito. Mas a onipresença de informações
proporcionada pelas novas tecnologias de comunicação desobrigou-o da
originalidade absoluta, idealizada, cabendo-lhe organizar e dialogar com
outras ideias e discursos em busca de uma nova identidade, ainda que
fragmentada.
Decalque da academia |
Casos de plágio acadêmico ganham visibilidade na mídia Plágio
é coisa séria. Mas quando ocorre na academia, pode custar uma carreira e
até depor autoridades. Em fevereiro deste 2013, a ministra da Educação
alemã Annette Schavan renunciou após acusações de que teria copiado
trechos de sua tese de doutorado, defendida há trinta anos na
Universidade Heinrich Heine, em Düsseldorf. No ano passado, a Hungria
viu seu presidente Pál Schimitt abandonar o posto pela mesma acusação.
Não
há estatísticas sobre plágios no meio acadêmico, que tendem a ser
resolvidos internamente, sem acionamento da Justiça. Raro um caso como o
de um pesquisador da USP de Ribeirão Preto, exonerado em 2011 após ser
denunciado por professores da UFRJ, que identificaram como deles as
imagens usadas pelo acusado num trabalho para a Faculdade de Ciências
Farmacêuticas.
Nada se compara, porém, ao "plágio em família"
ocorrido em Portugal no começo de 2013, envolvendo um casal de
pesquisadores: ele, um político social democrata, e ela, professora de
um instituto politécnico, defenderam teses com três anos de diferença no
Instituto Superior de Ciências do Trabalho, em Lisboa. Apurou-se que os
mestrados de ambos apresentavam excessivas semelhanças, em temas,
ideias, títulos, estilo dos parágrafos e até bibliografia. |
Como criar alunos-autores sem os vícios do "copia e cola" na internet |
Um roteiro de atividades para estimular a
noção de autoria nos alunos e evitar o uso indiscriminado da web em
trabalhos escolaresAtualmente,
não é um real problema a internet disponibilizar aos estudantes um
universo praticamente infinito de informações. O problema está em como
os docentes e as escolas podem usar esse universo de informações ao seu
favor. Criatividade, fundamentação pedagógica, técnicas
didático-metodológicas inovadoras e conhecimento das novas tecnologias
são fatores importantes para evitar o plágio e convidar os alunos a
realizarem pesquisas genuínas. Isso pode ser obtido por meio de
atividades que exijam dos estudantes atitudes, posicionamentos e
reflexão, valendo-se de ferramentas alternativas de produção de
pesquisa. Vejamos algumas propostas: Uma
pesquisa que envolva um "olhar" sobre dado assunto, sendo esse olhar
relatado por pessoas pesquisadas, não por livros didáticos ou fontes da
internet (pesquisa oral);
Um trabalho que consista em extrair
da internet dois textos sobre o mesmo assunto, em que o estudante
precise identificar posturas diferentes e explicar essas posturas
diferentes em ambos os textos;
Atividades em que seja
necessário um registro fotográfico de fenômenos que estão sendo
pesquisados textualmente, tais como fenômenos físicos, químicos e
biológicos. O texto pode ser de fonte virtual, mas as fotos devem ser de
autoria dos estudantes, registradas em seus "cotidianos";
Produção de vídeos explicativos sobre temas pesquisados na internet.
Esses vídeos devem ter roteiro, objetivos, produção e créditos. Podem
ser gravados com o celular e editados na própria internet;
Uma
pesquisa sobre o tema baseada em imagens, não em textos, onde cada uma
delas deva ser explicada por um estudante do grupo, de forma textual ou
oral;
Solicitar aos alunos que façam pesquisas sobre um dado
tema, e toda a fonte de produção da avaliação escrita seria extraída dos
textos entregues pelos alunos. Isso forçaria aos estudantes, mesmo
aqueles que plagiaram, a estudar o que foi copiado para realizar a
avaliação.Juliano Costa é gerente pedagógico do Sistema de Ensino COC/Pearson |
Caçadores de cópias |
A tecnologia a serviço da detecção de plágios na redeLonge
de ser vilã da era moderna, a internet ampliou nossa consciência da
linguagem ao democratizar o conhecimento, e se por um lado facilitou
decalques em série, por outro ajudou na detecção deles por meio do
cruzamento de dados. Basta digitar uma frase conhecida em mecanismos de
busca como Google e Bing, por exemplo, para descobrir as mais variadas
ocorrências de uma expressão na rede, com resultados que vão desde
trivialidades creditadas erroneamente a escritores famosos até plágios
os mais descarados.
- Há alguns anos, quando um aluno me
apresentou uma conclusão de produção impressa, digitei uma frase
aleatória na ferramenta de busca do Google e encontrei o texto na
íntegra, mais de uma vez replicado em sites e blogs. Ao ser questionado,
ele afirmou ser de sua autoria. Com 14 anos, já tinha consciência do
que estava fazendo. O aluno foi advertido - relata a assessora
pedagógica Maria Cristina Lindstron, que possui mais de 20 anos de
experiência com o ensino fundamental e médio.
Ao que parece, no
"vale-tudo" da blogosfera e das redes sociais, em que retuítes,
citações e compartilhamentos de conteúdos alheios são parte
indissociável da atividade dos internautas, a autoria é quase um
detalhe, uma nota de rodapé sem muita importância. É nesse contexto que
professores e educadores devem manter-se antenados nas novas
tecnologias, sendo capazes usá-las a seu favor no combate ao plágio.
Fruto
da necessidade acadêmica de atestar a originalidade de trabalhos de
pesquisa, algumas ferramentas foram desenvolvidas especificamente para
detectar o plágio de textos. Uma delas, o Plagius [www.plagius.com],
trabalha com diversos formatos de arquivo (doc, pdf, rtf, etc.),
fornecendo relatórios detalhados sobre ocorrências semelhantes na
internet e suspeitas de decalque. O Farejador de plágio
[www.farejadordeplagio.com.br], por sua vez, também vasculha a internet
atrás de plágios do arquivo-alvo, pesquisando inclusive "trechos
saltados" em obras para serem analisados posteriormente.
Considerando
que nem tudo o que se produz na academia está disponível para consulta
na internet, os resultados obtidos por esses aplicativos não são de todo
confiáveis - o que, evidentemente, não lhes tira o mérito. |
Não gosto de plágio |
Blog reúne denúncias na área de tradução Bom
exemplo de utilidade pública, para defender a propriedade intelectual
por meio da blogosfera, encontra-se no campo da tradução. O blog Não
gosto de plágio [http://naogostodeplagio.blogspot.com.br/], da tradutora
Denise Bottmann, é uma referência na defesa dos direitos autorais de
tradutores, muitas vezes nem creditados nas obras.
O blog foi
criado em 30 de setembro de 2008 (dia do tradutor) em meio a uma onda de
denúncias de plágio de traduções. Entre as principais irregularidades,
destacam-se as edições piratas feitas a partir de trechos e elementos de
traduções anteriores. Tudo sem pagar nem dar crédito aos reais
tradutores-autores.
- Creio que o trabalho sistemático de
cotejos e apontamentos no Não gosto de plágio acabou mostrando que a
prática era muito mais disseminada do que se imaginava, e ganhou grande
repercussão. Considero que o blog atingiu grande parte de seus
objetivos, conseguindo a retirada de muitos títulos do mercado e, se não
a extinção, ao menos uma visível diminuição desses procedimentos
ilícitos - afirma Denise.
O blog apresentou cerca de 150
cotejos de obras espúrias, além de ter denunciado outras
irregularidades, como a inscrição de fraudes no Programa Nacional do
Livro de Baixo Preço, do Minc/FBN. O blog encaminhou mais de dez pedidos
de representação junto ao Ministério Público para coibir essas
práticas. |
O tecido das citações |
Um trecho de "A morte do autor", de Roland Barthes"Sabemos
agora que um texto não é feito de uma linha de palavras, libertando um
sentido único, de certo modo teológico (que seria a ''mensagem'' do
Autor-Deus), mas um espaço de dimensões múltiplas, onde se casam e se
contestam escritas variadas, nenhuma das quais é original: o texto é um
tecido de citações, saídas dos mil focos da cultura. Parecido com
Bouvard e Pécuchet [personagens de Gustave Flaubert], esses eternos
copistas, ao mesmo tempo sublimes e cômicos, e cujo profundo ridículo
designa precisamente a verdade da escrita, o escritor não pode deixar de
imitar um gesto sempre anterior, nunca original; o seu único poder é o
de misturar as escritas, de as contrariar umas às outras, de modo a
nunca se apoiar numa delas; se quisesse exprimir-se, pelo menos deveria
saber que a ''coisa'' interior que tem a pretensão de ''traduzir'' não
passa de um dicionário totalmente composto, cujas palavras só podem
explicar-se através de outras palavras, e isso indefinidamente: aventura
que adveio exemplarmente ao jovem Thomas de Quincey, tão bom em grego
que, para traduzir para esta língua morta ideias e imagens absolutamente
modernas, diz-nos Baudelaire, ''tinha criado para si um dicionário
sempre pronto, muito mais complexo e extenso do que aquele que resulta
da vulgar paciência dos temas puramente literários'' (Os Paraísos
Artificiais); sucedendo ao Autor, o scriptor não tem já em si paixões,
humores, sentimentos, impressões, mas sim esse imenso dicionário onde
vai buscar uma escrita que não pode conhecer nenhuma paragem: a vida
nunca faz mais do que imitar o livro, e esse livro não é ele próprio
senão um tecido de signos, imitação perdida, infinitamente recuada." |
artigo original: http://revistalingua.uol.com.br/textos/93/artigo292190-1.asp#.Ue_h1nQRMXo.twitter